“Olha pro céu, que lindo!”
Eles diziam, uns aos outros, enquanto eu tentava apreciar o tal espetáculo por detrás de seus corpos. Nem mesmo uma frestinha me permitia ver aquele suposto céu tão belo, aquele que todos os outros conseguiam apreciar em toda a sua glória natural. Eu sentia o sol bater, notava as cores vibrantes que ele aplicava na paisagem, mas me era privado o direito de poder enxergar aquilo que a multidão à minha frente via.
Não é nenhuma surpresa. Sou pequeno, e eles, todos grandes. Eles não precisam de muito esforço; basta moverem as nucas e o rosto para cima, e voilà! Lá está a paisagem sonhada. Já eu preciso de uma ajudinha. Me enfio ali, me esgoelo aqui, me posiciono acolá, e tenho a sensação de que esse céu está sendo propositalmente escondido de mim. Escuto as pessoas falarem entre si sobre o que estão vendo, umas rindo, se abraçando e apertando mãos, enquanto eu, dedo indicador meio levantado, não termino frases porque minha voz não atinge o alvo.
Claustrofobia. Me sinto sufocado. Se ninguém me escuta, será porque minha voz não alcança os ouvidos tão altos dos demais? Ou será que ela é dissolvida na cacofonia de risos e conversas paralelas? Será porque ninguém me percebeu aqui embaixo? As possibilidades são tantas, mas a verdade é que já não é só o problema de não ver o céu que está na minha cabeça.
“O bom desse céu é que é grande. Não acaba nunca, vai até lá longe, que nem um abração!” Um pai diz à sua filha pequena. Se o céu é um grande abraço, porque estou de fora? Seria eu menos digno do que todas essas outras pessoas? Todas são abraçadas pelo céu grande, menos eu. O melhor abraço que consegui foi o que dei em mim mesmo, quando senti o frio da noite se aproximando.
Se foi deus quem fez o céu, então porque essa dificuldade de sentí-lo? O que me falta em meio a tantas pessoas felizes, satisfeitas e plenas? Será que me falta o sorriso leve e a postura dessas pessoas? Ok, vamos tentar.
… Não, ainda estou longe do céu.
Algumas pessoas olham pra baixo de vez em quando. Até falam comigo. Me perguntam do que preciso, se quero ajuda. Mas não me oferecem o mais importante; um lugar no meio deles, um ombro pra que eu me apoie, uma escada, sei lá. Não estou em pé de igualdade, pelo contrário, sequer tenho voz com essas mesmas pessoas; que falam comigo pra que eu escute, mas não se permitem escutar o que eu falo de volta. É como chorar lágrimas em um oceano.
Já se passaram horas e nada de eu conseguir olhar pro céu e ver o que tem de tão especial nele. Parece o fim do mundo, tanta gente reunida olhando pra cima e rindo e conversando e… argh! Tudo bem, que se danem eles, eu não preciso de ninguém. Não deles, e não de céu nenhum. Meu chão firme nunca me traiu e é pra ele que eu vou ficar olhando…
… Passou das sete da noite. O tal céu já está completamente escuro, e eu ainda sento com as pernas e braços cruzados. Algumas pessoas olham pra mim, mas nada dizem. N-não que eu esteja esperando alguém falar qualquer coisa! Eu sou diferente agora. Tô em outra vibe.
… Ok, isso é ridículo. Todo mundo está vendo essa desgraça desse céu, menos eu. Todo mundo ri, menos eu. Todo mundo se abraça, menos eu. Todo mundo racha uma água de coco, menos eu. O número de pessoas aqui é ímpar; todos tem um par, menos eu que sobrei. Chega. Vou ver esta merda seja como for, nem que eu tenha que passar por cima de todo mundo pra conseg-
…
…
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… cheguei no céu e agora não sei como volto pra casa.